Feitiçaria
Chiloé, 1880. Rosa é uma garota huilliche que, depois do assassinato de seu pai, chega em busca de justiça junto a Mateo Coñuecar, que é líder de uma organização de bruxos e rapidamente se torna seu avô adotivo. Quando Mateo é preso, acusado de ser uma autoridade paralela na República do Chile, Rosa assumirá o desafio de libertá-lo, mesmo que isso a inicie nos caminhos da bruxaria.
Análise de “Feitiçaria”
“Feitiçaria” começa com um prelúdio audacioso, onde o chileno Christopher Murray nos convida a um lugar descrito como o fim do mundo para alguns, mas para os originários, o eterno começo. Esta obra cinematográfica nos transporta para as Ilhas de Chiloé, não somente geograficamente, mas emocional e historicamente, enquanto explora a opressão vivenciada pelo povo huilliche através dos olhos da jovem Rosa, vivida com uma intensidade quase palpável por Valentina Véliz Caileo.
A atmosfera é densa e carregada de significado; o uso de sépia e a paleta de cores restrita, acompanhados por uma trilha sonora que é quase um lamento, reforçam a gravidade do retrato de Murray sobre a história de colonização e a resistência indígena. Rosa, com apenas 13 anos, torna-se o veículo pelo qual experienciamos não só as perdas físicas, mas também a erosão da identidade – uma perda que transcende o tempo e precede a própria consciência da protagonista.
Murray, juntamente com o co-roteirista Pablo Paredes, trança habilmente o real com o etéreo, entrelaçando mitologia local e a dura realidade dos atos coloniais com uma habilidade que confere ao filme um caráter de suspense inusitado. “Feitiçaria” é perturbador em seu realismo, mas cativante em sua mística, oscilando entre cenas de julgamentos e rituais, de histórias recontadas e cultos reimaginados.
O que emerge é uma narrativa que desafia a linearidade, onde o mito e a história, o humano e o místico, tecem juntos uma tapeçaria que reflete a complexidade da experiência humana em meio ao choque de culturas. Murray cria uma experiência cinematográfica que é tanto uma exploração das sombras da história quanto um tributo à resiliência e à reivindicação da identidade. “Feitiçaria” é uma jornada sombria, mas necessária, através de uma memória coletiva que exige ser reconhecida e honrada.